Batom. É só olhar para um batom quebrado e meio rosado que me lembro de Clarinha. Nós duas sem ter muito o que falar, sem ter muito o que fazer e sem ter muito o que esperar. A gente não tem noção do tempo até ver que perdeu!
Clarinha sorria desde quando nos encontramos em um ponto de ônibus. Caia uma chuva fina, daquelas que toda mãe fala que é de molhar bobo, e eramos duas bobas.
Não sei até hoje o que aquele momento carregava. Era para ser um bate-papo informal entre duas amigas que resolvem beber uma cerveja depois do serviço, nada de mais. Clarinha era diferente, sempre impecável. E eu, bem, eu era apenas a Maria.
Lembro de observar a Clarinha limpando a boca com um guardanapo. Aquelas digitais marcadas de rosa sobre a seda foram as portas abertas. Clarinha falava e eu nem escutava. Estava fixada nas digitais de seus lábios, que pareciam dançar para mim enquanto ela falava.
-Maria, o que foi? Meu batom esta borrocado? Pera ai que eu vou passar...Para de olhar assim, parece até que eu tenho algo errado.
Disse Clarinha, com uma inocência extravagante nos olhos.
Eu era carregada por uma vontade muito infantil, acho que por culpa das novelas, que como toda brasileira fui obrigada a engolir goela a baixo. Eu tinha uma vontade de ter um amor, dar um beijo que parasse tudo. Percebi naquele instante que esse beijo só poderia ser com Clarinha.
Os lábios dessa mulher me transformaram em sua pose. E numa estranha admiração tomei o batom de suas mãos e pedi que ela pintasse meus lábios. Era apenas para que ficassem parecidos com os lábios que tanto me prendiam.
Como em um encantamento passei também o batom naqueles lábios impecáveis de Clarinha, me sentia cada vez mais presa a eles, e me puxaram como um ima. Eu a beijei. Na verdade foram os lábios dela que me beijaram. Os lábios de uma mulher possuem uma autoridade capaz de cometer tudo, ate um pecado impecável.
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